Na indústria de alimentos, a extrusão sempre foi sinônimo de cereais, snacks inflados ou alimentos para pets. Mas um novo movimento vem ganhando força: a aplicação dessa técnica para transformar proteínas do leite em ingredientes funcionais e produtos com textura surpreendente. E a pergunta que fica é: estamos prontos para aceitar um queijo “extrusado”?
O artigo de Lorenzen & Ahrné (2025), publicado na Trends in Food Science & Technology, aborda exatamente isso: o uso de extrusoras – principalmente de parafuso duplo – como ferramenta para criar texturas inéditas a partir de caseína e proteínas do soro de leite. A extrusão permite obter queijos fibrosos semelhantes aos do tipo pasta-filata, micropartículas proteicas com funcionalidade superior e produtos com perfil nutricional aprimorado, inclusive por meio da combinação com ingredientes vegetais.
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A grande sacada está na possibilidade de construir estruturas tridimensionais alinhadas, ajustando temperatura, pressão e força de cisalhamento, tudo isso com controle preciso da viscosidade, do conteúdo de gordura e até da porosidade final. Os dados experimentais demonstram que, ao injetar pequenas quantidades de gás nitrogênio (0,05 a 0,15% p/p), é possível obter uma “microespuma” de queijo, com textura mais leve e macia – o que pode ser ideal para o público sênior ou para novos formatos de consumo.
Mas o mais impressionante é que as funcionalidades dessas proteínas extrusadas vão muito além da estrutura. Ao simular os glóbulos de gordura, as micropartículas formadas por WPI (isolado proteico de soro) oferecem textura cremosa a produtos com baixo teor de gordura. Isso significa, por exemplo, que uma bebida láctea ou um iogurte dietético pode ter sensação de cremosidade e corpo – mesmo com fórmulas mais leves.
Claro que nem tudo são flores. Ainda há muitas lacunas: o comportamento da gordura durante a extrusão de queijos, a influência do cálcio e da umidade, e a necessidade de estudos sensoriais com consumidores reais. Além disso, não há uma clareza sobre os impactos ambientais reais da substituição de etapas tradicionais de cozimento (como nas macas de queijo mussarela) por extrusão. Uma avaliação de ciclo de vida (ACV) se faz urgente.
Mas é impossível negar o potencial. A extrusão pode trazer economia de água, energia, controle de perdas e ganhos em produtividade. Mais do que isso: abre espaço para formulações híbridas, misturando leite e plantas, como amido de ervilha ou fibra de trigo – uma combinação interessante para snacks, barras e até queijos funcionais.
Neste cenário, a indústria láctea precisa deixar de lado o preconceito e se abrir ao uso de tecnologias modernas para além da pasteurização, secagem e fermentação. A extrusão é uma aliada poderosa na busca por alimentos de alto valor agregado, mais acessíveis, sustentáveis e adaptados a nichos de mercado ainda pouco explorados.
Se o consumidor já aceita carnes plant-based, por que não aceitaria um queijo de alta umidade estruturado por extrusão? A pergunta não é mais se vai acontecer. A questão é: quem vai liderar esse movimento?
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