BPF, APPCC ou certificações: qual implementar primeiro?

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A implementação de sistemas de qualidade e segurança dos alimentos é essencial para qualquer indústria de alimentos — e mais ainda no setor lácteo, altamente regulado e exigente em termos de rastreabilidade, higiene e controle sanitário. Mas uma pergunta recorrente em empresas de pequeno e médio porte é: por onde começar?

Antes de investir tempo e recursos em sistemas complexos, como normas de certificações, é preciso compreender a função de cada ferramenta e a ordem lógica de implementação, respeitando o nível de maturidade da empresa. Este artigo detalha esse caminho, com foco prático para quem está estruturando ou ampliando sua área de qualidade.

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Representação em pirâmide da hierarquia de implementação dos sistemas de segurança de alimentos: a base são os Programas de Autocontrole (BPF), seguidos do APPCC e, por fim, das certificações internacionais.

1. BPF – Boas Práticas de Fabricação: o ponto de partida obrigatório

A implementação da BPF é o primeiro passo para qualquer empresa que deseje operar com segurança e legalidade no Brasil. Ela é exigência legal da ANVISA (RDC 275/2002) e do MAPA (IN 04/2007 e outras específicas para o setor de laticínios), sendo um pré-requisito para todos os demais sistemas.

O que compõe a BPF:

  • Layout higiênico-funcional;

  • Higiene pessoal e dos ambientes;

  • Controle integrado de pragas;

  • Potabilidade da água;

  • Capacitação de colaboradores;

  • POPs (Procedimentos Operacionais Padronizados);

  • Manual de BPF;

  • Rastreabilidade básica.

Sem esses elementos funcionando de forma constante e documentada, não é viável implantar nenhum sistema mais robusto — muito menos esperar certificações.

Além disso, a BPF estabelece a cultura da higiene e da organização. Empresas que “pulam” esse passo geralmente enfrentam retrabalho quando tentam aplicar normas mais complexas sem dominar o básico.

2. APPCC – Um sistema de controle preventivo

O APPCC (HACCP) é uma ferramenta científica e sistemática voltada para identificação, avaliação e controle de perigos significativos à segurança do alimento. Seu objetivo é prevenir contaminações ao longo da cadeia produtiva, com foco na etapa de processamento.

Por que ele vem depois da BPF?

O APPCC não substitui a BPF — ele a complementa. Ele atua somente nos riscos mais críticos, e pressupõe que todos os pré-requisitos estão funcionando. Isso inclui limpeza, sanitização, capacitação de pessoal e estrutura adequada.

Estrutura básica do APPCC:

  1. Formação da equipe APPCC;

  2. Descrição detalhada do produto e uso pretendido;

  3. Elaboração do fluxograma do processo;

  4. Validação do fluxograma in loco;

  5. Identificação de perigos e medidas preventivas;

  6. Determinação de PCCs (Pontos Críticos de Controle);

  7. Estabelecimento de limites críticos;

  8. Monitoramento;

  9. Ações corretivas;

  10. Verificação;

  11. Registro e documentação.

Empresas que tentam “implementar o APPCC” antes de dominar os POPs e os registros da BPF normalmente falham nas auditorias por falta de base operacional.

3. Certificações internacionais – Visibilidade, competitividade e reconhecimento

Com a BPF consolidada e o APPCC funcionando, chega a hora de considerar certificações internacionais. Elas oferecem credibilidade e abertura de mercados, especialmente no caso de exportações, fornecimento para grandes redes ou atuação com marcas próprias.As principais certificações no setor alimentício são:

  • ISO 22000: sistema de gestão de segurança de alimentos com base no APPCC + ISO 9001;

  • FSSC 22000: evolui a ISO com escopo reconhecido pela GFSI (Global Food Safety Initiative);

  • BRCGS: padrão britânico amplamente aceito na Europa;

  • IFS Food: certificação forte na Alemanha, França e outros países europeus.

Características das certificações:

  • Exigem sistema APPCC documentado e funcionando;

  • Requerem gestão de riscos, revisão gerencial e auditorias internas;

  • Possuem forte apelo comercial e marketing;

  • Demandam equipe técnica bem treinada e cultura de melhoria contínua.

Nenhuma certificação se sustenta sem uma base operacional sólida. Por isso, tentar “pular etapas” costuma gerar reprovação na auditoria de primeira parte.

Comparativo prático: o que vem primeiro?

Tabela comparativa de diferentes níveis de controles denrto da indústria

4. Estratégia recomendada de implementação

  1. Diagnóstico técnico da empresa (layout, POPs, treinamentos, registros);
  2. Implantação completa da BPF, com monitoramentos e auditorias internas;
  3. Mapeamento de perigos e aplicação do APPCC, com validação de fluxograma e definição de PCCs;
  4. Simulação de auditoria para identificar não conformidades;
  5. Escolha da certificação mais compatível com seu mercado e capacitação da equipe para atendimento aos requisitos adicionais.

Conclusão: maturidade e consistência acima de velocidade

Não existe atalho sustentável na construção de um sistema de qualidade. Cada etapa tem seu papel e deve ser respeitada. A BPF garante segurança operacional, o APPCC promove a prevenção inteligente de riscos, e as certificações posicionam sua empresa em um novo patamar de mercado

.Empresas que respeitam essa sequência ganham mais do que selos e certificados: ganham eficiência, cultura organizacional, engajamento da equipe e sustentabilidade de processos.

Foto de Marieli Rosseto

Marieli Rosseto

Doutora e mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos, graduada em Tecnologia de Alimentos e Agronegócio. Especialista em Qualidade, Segurança de Alimentos e Educação Inclusiva, atua como especialista de processos na indústria de soro de leite e professora na área de qualidade no setor lácteo. Na pesquisa, dedica-se ao desenvolvimento de soluções sustentáveis para a indústria de alimentos, como filmes biodegradáveis a partir de resíduos. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8172882358532158

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