Por trás de um leite de qualidade está um processo muitas vezes subestimado: o manejo higiênico do úbere. Embora pareça simples, a forma como os tetos são higienizadas antes e depois da ordenha interfere diretamente na saúde da glândula mamária e nos parâmetros de qualidade do leite, como a CCS e a CBT. Negligenciar esse cuidado pode significar perdas produtivas, aumento de descarte e risco de contaminações. Neste artigo, mostramos passo a passo como realizar esse manejo de forma eficaz, descomplicando a rotina e elevando o padrão da produção primária.
Passo 1: Avaliação visual e tátil da glândula
Antes de qualquer produto químico, a inspeção visual e a palpação dos tetos e do úbere são essenciais. Busque sinais de inchaço, endurecimento, feridas, secreção anormal ou resíduos de esterco e lama. Ao identificar alterações, oriente o descarte do leite e a separação do animal, comunicando a equipe técnica.
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Passo 2: Pré-dipping — a desinfecção antes da ordenha
O pré-dipping é a aplicação de solução desinfetante (geralmente à base de iodo ou cloro) nos tetos antes da ordenha. Deve-se imergir os tetos em copos próprios, cobrindo completamente a área exposta. Esse processo reduz a carga microbiana superficial e evita que microrganismos entrem no canal do teto durante a extração do leite.
Tempo de contato ideal: de 20 a 30 segundos.
Passo 3: Secagem com papel-toalha individual
Após o pré-dipping, cada teto deve ser secada com um papel descartável individual (nunca pano reutilizável). Essa secagem remove o excesso de produto e resíduos, além de permitir uma inspeção final da pele. O uso de panos compartilhados é um dos principais erros que favorecem a contaminação cruzada.
Passo 4: Descarte dos primeiros jatos
O primeiro leite de cada teto deve ser descartado em caneco de fundo escuro, permitindo a observação de grumos, alteração de cor ou textura — sinais clássicos de mastite clínica. Essa medida reduz a carga microbiana no leite e evita que um animal com infecção subclínica comprometa todo o tanque.
Passo 5: Pós-dipping — o escudo protetor após a ordenha
Após a retirada do conjunto de ordenha, deve-se aplicar imediatamente o pós-dipping. Essa barreira química evita a entrada de microrganismos enquanto o esfíncter do canal do teto permanece aberto (cerca de 30 minutos após a ordenha). Produtos à base de iodo com emolientes são os mais comuns, ajudando também na hidratação da pele.
Importância do manejo higiênico na CCS
A Contagem de Células Somáticas (CCS) é um dos principais indicadores de saúde da glândula mamária. Valores elevados estão diretamente associados à mastite e podem causar perda de bônus por qualidade, descarte de leite e uso excessivo de antibióticos. O manejo higiênico é a forma mais barata e eficaz de prevenir infecções intramamárias — desde que feito corretamente e de forma constante.
Erros comuns que comprometem o resultado
Mesmo com boas intenções, alguns erros são recorrentes:
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Uso de produtos fora da validade ou mal diluídos
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Tempo de contato insuficiente no pré-dipping
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Falta de treinamento dos ordenhadores
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Uso de panos compartilhados ou úmidos
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Ausência de rotina para descarte do primeiro jato
Evidências científicas que comprovam os benefícios
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Higiene adequada dos tetos reduz significativamente a CCS
Um estudo com 581 fazendas leiteiras mostrou que a prática de secar os úberes após a lavagem e a utilização de desinfecção pós-ordenha resultaram em reduções médias de 44.000 e 70.300 células/mL na CCS, respectivamente. - Tetos sujas antes da ordenha estão associados a CCS mais altas e mais mastite clínica
Em fazendas com sistemas automáticos de ordenha, tetos sujos antes da ordenha estavam correlacionados com maior CCS e maior incidência de mastite clínica . -
Uso contínuo de produtos pós-ordenha reduz hiperqueratose e melhora a qualidade do leite
O uso do desinfetante Forticept® reduziu significativamente a CCS e melhorou os teores de gordura, proteína e caseína do leite, além de reduzir em mais de 35% os casos de hiperqueratose nos tetos. -
Pontuações de higiene do úbere correlacionam-se fortemente com CCS elevada e risco de mastite subclínica
Estudo recente no Nepal mostrou que vacas com úberes sujos apresentaram CCS significativamente mais altas e maior prevalência de mastite subclínica.
Conclusão
O manejo higiênico do úbere é uma técnica simples, mas poderosa. Pequenas falhas nesse processo comprometem a qualidade do leite, elevam os custos com mastite e impactam diretamente no lucro da propriedade. Seguindo um protocolo bem definido, com bons produtos e equipe treinada, é possível reduzir significativamente a CCS e garantir um leite mais seguro, saudável e valorizado.
A importância do manejo higiênico do úbere se conecta diretamente às práticas de ordenha segura, que vão além da simples extração do leite e envolvem cuidados com a higiene, bem-estar animal e prevenção de contaminações. Como reforçado no artigo “Ordenha segura: práticas indispensáveis”, cada etapa — da avaliação prévia ao pós-dipping — deve ser conduzida com rigor técnico e constância para assegurar um leite de alta qualidade e reduzir riscos microbiológicos.